A morte democrática

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O homem tem uma identidade simbólica que o destaca nitidamente da natureza. Ele é um eu simbólico, uma criatura com um monte de história de vida. É um criador com uma mente que voa alto para especular sobre o átomo e o infinito, que com imaginação pode colocar-se em um ponto no espaço e, encantado, contemplar o seu próprio planeta. Essa imensa expansão, essa sagacidade, essa capacidade de abstração e essa consciência de si mesmo dão ao homem a posição de um pequeno deus da natureza. No entanto, ao mesmo tempo, como sabiam os sábios orientais, o homem é um verme e um alimento para os vermes. Este é o paradoxo: ele está fora da natureza e inevitavelmente nela; ele é dual, está lá nas estrelas, e, no entanto, acha-se alojado num corpo cujo coração pulsa e que respira. Seu corpo é um invólucro de carne, que lhe é estranho sob muitos aspectos – um dia irá definhar e morrer. O homem está dividido em dois: tem consciência de sua esplêndida e ímpar situação de destaque na natureza, dotado de uma dominadora majestade, e, no entanto, retorna ao interior da terra, uns sete palmos, para muda e cegamente apodrecer e seu corpo desaparecer para sempre.

Com a aproximação da morte, o curso dos pensamentos, quer ele tenha seguido dogmas religiosos, quer não, assume uma direção moral, e é partindo de considerações morais que ele se esforça para saldar as contas com o curso da vida que se conclui. O homem demonstra especial interesse pela espiritualidade. Naturalmente, existe o implacável mecanismo de contagem do tempo, o rigor da decadência biológica, a morte, ou seja, o dia que, de maneira democrática é igual para todos.