O Banquete de Platão – Eros, o amor

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Apresento, aqui, uma das principais obras de Platão, senão a principal, O Banquete.

No início, Apolodoro diz que vai narrar o que ele tinha ouvido falar sobre um outro banquete, que havia acontecido tempos atrás; portanto, um exercício dialético narrativo. As personagens de O Banquete são Pausânias, o anfitrião; Fedro, o orador; Agatão, um poeta; Erixímico, o médico; Aristófanes, o dramaturgo; Sócrates, e Alcebíades, um político que chega depois. Além disso, é mencionada a sacerdotisa Diotima, de Mantineia. Os convidados foram comemorar a vitória de Fedro em um concurso de oratória e propuseram um elogio ao amor, ou seja, a definição, os predicados e os atributos do amor. Trata-se, portanto, de uma remissão simbólica a Dionísio, o deus grego do vinho, e a Afrodite, a deusa do amor. O que Eros produzia nos homens e por que os afetava? – era a pergunta que se faziam.

Há duas forças na mitologia grega de que se afirma que nem os deuses estão livres: o destino e o amor. Porém, o amor necessariamente não é o que traz a felicidade; pode ser uma força trágica. Os gregos entendiam que quem não fosse autônomo, ou se submetesse ao amor, não era feliz. O amor acaba submetendo o que ama ao amado.

O segundo a falar foi Fedro, que disse ser eros um deus e, como deus, tornava divino aquele que participava (quem ama se sacrifica pelo ser amado). Ele cita os exemplos de Alceste que, movida pelo amor, ofereceu-se para morrer pelo esposo e menciona Orfeu (do orfismo, uma seita religiosa e filosófica que deu origem à escola pitagórica), que vai ao Hades, o reino dos mortos, para se sacrificar e buscar a sua amada Eurídice, que havia falecido. Conta que Hades permite que Orfeu (um semideus) leve a alma de sua amada do mundo dos mortos, sob a condição de não olharem para trás. Orfeu, então, resgata Eurídice, porém ela tem curiosidade e olha para trás, desaparecendo. Orfeu tem a força da atração, e, ainda no Hades, as ninfas se apaixonam por ele, disputando-o e destruindo-o.

Fedro ainda cita um último exemplo, o de Aquiles, que na Ilíada de Homero vai se sacrificar por Pátroclo. Aquiles sai em busca de sua amada, decide entrar na guerra em favor dos egípcios, porém ele também tem uma relação amorosa com Pátroclo, que veste as armas de Aquiles, tenta invadir a fortaleza de Tróia e é morto.

Pausânias diz que Fedro, orador, usou a tradição ao falar do elogio ao amor e comenta não haver um só eros, mas dois: um vulgar, aquele que ama o corpo do amado, que murcha e fenece como a flor do campo (a representação da Afrodite terrena), e outro celeste, que diviniza, que dura para sempre, e que ama a alma (que representa a Afrodite celeste). O amor platônico é justamente aquele que ama a alma (o belo).

Erixímaco, o outro a discursar, fala de um amor que não é entre duas pessoas, mas uma força cósmica (a separação e a união). Defende que o verdadeiro médico é o erótico, aquele que harmoniza os humores, assim como os políticos, que harmonizam os contrários. Diz que tudo depende do amor. É uma força que impulsiona a vida.

Aristófanes, que havia escrito “As Nuvens”, uma sátira a Sócrates (o filósofo), dizendo que não tinha qualquer utilidade para a cidade, narra um mito, o do andrógino. Diz que nos tempos primordiais, os seres eram diferentes dos atuais. Eram esféricos, tinham quatro braços, quatro pernas e eram completos. Quiseram ir ao Olimpo para ocuparem o lugar dos deuses. Zeus, para puni-los, lançou seus raios e os dividiu. Ao fazê-lo, pediu para Hefesto, o deus dos artesãos, que os costurasse onde o corte havia sido feito. Cada andrógino ficou, então, com duas pernas e com dois braços. Depois, Zeus dispersou as metades por toda a terra, que ficaram procurando desesperadamente a outra metade. Eros, então, é a carência fundamental pela completude. As metades não se encontravam e não se encaixavam. Porém, quando se encaixavam, existia uma plenitude. A natureza originária, da unidade, era recobrada. Mesmo unidos haviam sido divididos e a relação à expressão amorosa acontecia com a recuperação da natureza originária. Eros era as metades que se encontravam pelo vínculo afetivo. Eros era o desejo de retornarem à origem.

A fala de Agatão descreve os predicados de eros, um excelente artesão, aquele que tem todos os dons da tekhnue (a arte de organizar a experiência para produzir um resultado que é útil), ou seja, a medicina e a arquitetura. Diz que a arte havia nascido da astúcia do ser humano (da deusa Métis), de modificar e superar a natureza. Assim, eros tinha todos os dons da deusa.

É importante ressaltar que os personagens que dialogam são de tempos diferentes, não existiram e nunca se reuniram.

Por último fala Sócrates, que estava mergulhado em um profundo recolhimento, e volta a si dizendo que não fará um discurso sobre eros, mas narrará um diálogo que teve na sua juventude com a sacerdotisa Diotina, da cidade de Mantineia. Esta havia lhe ensinado sobre as coisas do amor. Diz que eros não é um deus, mas uma entidade intermediária, numinosa, que faz a intermediação entre os mundos humano e divino. Eros é Daemon, filho de Hórus (a astúcia, o estratagema) e de Pênia (a pobreza, a carência). Eros é carente como a sua mãe e astuto como o seu pai. Eros é miserável, aquele que sempre quer e que usa a astúcia. Eros contempla a beleza; então busca o belo. Eros faz buscar a imortalidade através dos filhos (a imagem da imortalidade), a beleza, que move o homem em busca do conhecimento (um desejo), e o mundo inteligível (sensível). Há um caminho para a busca do conhecimento (a beleza enquanto tal), a beleza dos corpos e a beleza da alma (o corpo sem a alma é um cadáver e quando o corpo é animado, a manifestação da alma se mostra no olhar, na expressão, sendo essa a verdadeira beleza). Segundo ele, as virtudes é que fazem as almas belas – a temperança, a coragem, a prudência, a justiça. Elas espelham a beleza das leis, que remetem às ideias, e ao belo em si (a ideia do belo).

Alcebíades, um político real de Atenas, chega bêbado, ao final, e faz uma declaração de amor para Sócrates. Ele ama e odeia Sócrates. Alcebíades pergunta para Sócrates o que ele deve fazer para governar Atenas, que responde, “conhece-te a ti mesmo”.

Todos adormecem, somente Sócrates permanece acordado.